A deputada estadual Andréia de Jesus (PSOL) usou as redes sociais nesta quarta-feira para publicar uma carta aberta para relatar ameaças de morte que tem sofrido. Segundo a deputada, os insultos começaram após a realização de pedido para que a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), que ela preside, investigue a ação da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) e da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no último domingo (31) em Varginha, que resultou na morte de 26 pessoas.
Uma das ameaças que chamam a atenção é uma que diz que a deputada morreria como a vereadora carioca do mesmo partido de Andréia, Marielle Franco, executada em março de 2018.
“Seu fim vai ser igual ao da Mariele (sic)/ Pra tu ficar de exemplo”, diz as mensagens, seguidas por xingamentos.
Leia a carta completa escrita por Andréia de Jesus no fim desta reportagem.
Segundo a publicação da parlamentar, ainda no domingo, ela foi alertada pela imprensa e por moradores de Varginha sobre o ocorrido e abriu a investigação pela comissão “como é de praxe em situações similares.”
Após tornar público o pedido de investigação, Andréia afirmou que teve as redes sociais “invadidas por extremistas”, que segundo a parlamentar, distorceram as falas dela, com ódio e desrespeito.
Na carta, Andréia afirmou ainda que pediu proteção à Polícia Legislativa, que fez um registro de ocorrência, solicitando escolta para a deputada. Ela ainda afirmou que deve acionar a Delegacia de Crimes Virtuais para que sejam investigados os ataques sofridos nas redes sociais.
Andreia de Jesus tem 43 anos e foi eleita em 2018 pela primeira vez para uma vaga na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Advogada e militante das Brigadas Populares, ela participa do Gabinetona: um mandato coletivo, aberto e popular junto de parlamentares da Câmara de BH e da Câmara dos Deputados.
Íntegra da carta publicada nas redes sociais.
Carta aberta.
“seu fim será como o de Marielle Franco”
Não é com alegria que escrevo essa nota aos amigos, militantes e a todos que estão de alguma maneira conectados comigo!
Não é fácil abrir meu celular e me deparar com ameaças contra minha vida.
Assumi com muita responsabilidade a presidência da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
Em mais de 300 anos da história da Assembleia Legislativa, é a primeira vez que mulheres pretas são eleitas.
À frente da Comissão de Direitos Humanos, com muito orgulho tenho dado sequência a territorialização e enraizamento da Comissão.
Articulo pautas que são caras à população mineira:
a crise hídrica;
o racismo institucional contra comunidades tradicionais e quilombos;
a vida da juventude negra e favelada;
a população LGBTQIA+;
a questão dos imigrantes e refugiados no estado;
a insegurança alimentar e a fome;
a melhoria das condições de trabalho e garantia de direitos dos servidores, inclusive da polícia penal e da polícia militar do Estado de Minas Gerais;
atuo com as mulheres e os indígenas, cobrando reparação contra a mineração predatória
Não é fácil atuar com direitos humanos em uma conjuntura de desmonte das políticas públicas de redução do debate político a meme e da violência institucional sistemática contra mulheres.
No dia 31, voltava de uma agenda internacional para articular a cooperação entre Brasil e Senegal para a agroecologia. Minha equipe e eu fomos acionados por mais de 20 veículos de imprensa, por mães sem dinheiro para sepultar seus filhos, por uma rede de ativistas cobrando zelo pela memória de um jovem, querido por sua comunidade e que foi morto também na mesma operação. Jovem esse que segundo a comunidade não tem vínculo ou histórico com a criminalidade. Tudo sobre o episódio ocorrido em Varginha, onde 26 pessoas morreram após uma ação policial.
Como é de praxe em situações similares, a Comissão acolheu a denúncia e eu tornei público o ocorrido. Em seguida, todas as minhas redes sociais foram invadidas por extremistas distorcendo a minha fala, com comentários de ódio e desrespeito. E por fim ameaças contra a minha vida!
A Polícia Legislativa da Assembleia Legislativa de Minas Gerais acionou a Polícia Civil, fez um Boletim de Ocorrência e foi recomendada a minha adesão à escolta policial. Demos início a esse procedimento ainda no dia de hoje, devido à gravidade dos fatos.
Amanhã, iremos acionar a polícia civil, na delegacia de crimes virtuais para encaminhamento dos discursos violentos, das ameaças a minha integridade física e contra a minha vida!
Sou mulher preta, mãe solo, a primeira pessoa com curso superior na minha família, sou advogada popular, militante das brigadas populares. Filha de empregada doméstica, meus primos são garis e com muito orgulho construo o Partido Socialismo e Liberdade!
Em memória de Dandara dos Palmares e Marielle Franco, pela vida e luta de Dona Tereza do movimento desencarcera. E pelas maiorias sociais que são subalternizadas, invisibilizadas reafirmo meu compromisso inabalável pela luta, pelo direito à vida, pelo direito de ser mãe, pelo bem viver, pelo abolicionismo penal e pela vida da juventude negra e favelada.
Andréia de Jesus, 03 de novembro de 2021.