A escalada da tensão no Oriente Médio ameaça o mercado global de petróleo, impacta o preço das commodities e pode gerar pressão inflacionária e alta do dólar no Brasil.
A crescente escalada do conflito entre Israel e Irã, que envolve um país com armas nucleares (Israel) e outro que avança em seu desenvolvimento (Irã), não se limita apenas ao campo militar. As consequências dessa disputa geopolítica se estendem aos mercados globais, gerando um efeito cascata sobre os preços que o Brasil não conseguirá evitar.
Estreito de Ormuz Sob Ameaça
Um dos pontos mais críticos é a localização estratégica do Irã no Golfo Persa. O país, ao lado de Omã, controla o Estreito de Ormuz, uma rota marítima vital para o comércio da região. É por esse estreito que passam produtos importados pela Arábia Saudita e um grande volume de exportações brasileiras, especialmente de carne, destinadas à Arábia Saudita e aos Emirados Árabes Unidos.
No entanto, a maior importância de Ormuz para a economia global reside no transporte de combustíveis fósseis. Aproximadamente um quarto do petróleo comercializado no mundo transita por ali, incluindo o material extraído do próprio Irã e de outros grandes exportadores como Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Kuwait e Iraque.
Com o início dos ataques israelenses a alvos iranianos, a agência iraniana IRA Novosti mencionou a possibilidade de fechamento do estreito. Embora a ameaça ainda não tenha se concretizado, a falta de segurança já fez com que uma das maiores empresas de petroleiros do mundo, a Frontline, anunciasse em 14 de junho que evitará a rota de Ormuz devido ao conflito.
Exportação de Petróleo sob Risco e Impacto nos Preços
Mesmo que o Estreito de Ormuz não seja bloqueado, a disputa entre Israel e Irã já afeta o preço do petróleo. O preço do óleo cru subiu 7,26% apenas na sexta-feira (13). Em comparação com 10 de junho, quando os rumores de um possível ataque israelense começaram a se espalhar, a alta acumulada atingiu 12,3%. A expectativa é que essa trajetória ascendente continue com a reabertura dos mercados.
Israel atacou pelo menos quatro pontos estratégicos para a economia do Irã: a refinaria do campo de óleo Shahran, a refinaria no campo de South Pars, outra refinaria de gás natural em Fajr Jam e o porto de Kangan LNG, no Golfo Pérsico.
Devido a sanções impostas pelos Estados Unidos e outros países ocidentais, o Irã vende a maior parte de seu petróleo para a China. Assim, em um primeiro momento, a quebra na cadeia de exportação do petróleo iraniano pode não afetar diretamente o Ocidente. Contudo, como o petróleo é uma commodity, a lei da oferta e da procura prevalece: com a oferta menor e a procura relativamente estável, o preço global tende a subir. Sem o petróleo iraniano, a China terá de buscar outras fontes e disputar mercados com outras nações, elevando ainda mais os preços. O Irã possui a quarta maior reserva de petróleo do mundo.
O aumento no preço do petróleo tende a se refletir imediatamente nos postos de combustíveis brasileiros. Além disso, deve afetar o preço de itens importados e daqueles que, mesmo fabricados no Brasil, dependem de peças vindas do exterior. A maior parte dos produtos nas gôndolas de supermercado depende do transporte rodoviário no Brasil (cerca de 65% do transporte de cargas é feito por caminhões), o que, segundo Renan Silva, professor de Economia do Ibmec Brasília, leva à elevação do preço do frete e das mercadorias que chegam ao consumidor final.
Uma consequência secundária é a possível manutenção da taxa de juros elevada como um remédio contra a inflação. “Já estamos trabalhando com índice acima da meta inflacionária. Isso é preocupante e pode fazer com que nossa taxa de juros, que já é muito elevada, permaneça por um período ainda maior”, explica Silva.
Instabilidade Favorece o Dólar
Em um cenário mais amplo, um conflito de grandes dimensões entre Israel e Irã aumentará a volatilidade do mercado internacional. Com o temor de que a guerra se expanda e envolva outros atores importantes, como os Estados Unidos, o futuro se torna mais incerto.
Em tempos de instabilidade, a tendência do mercado é buscar ativos seguros, como o dólar. Isso gera uma valorização da moeda americana, enfraquecendo o real e fazendo com que o preço de commodities e seus derivados tenda a subir no Brasil. “O dólar, apesar de todos os questionamentos, é a moeda que ainda tem maior credibilidade junto à economia global”, afirma o professor Renan Silva. Ele compara o cenário à invasão da Rússia à Ucrânia, que gerou um efeito semelhante, aumentando também a procura pelo ouro.
Silva ressalva que ainda é cedo para avaliar todas as consequências econômicas e geopolíticas da guerra entre Israel e Irã, mas destaca: “De toda sorte, o dólar já ganhou valor frente às outras moedas e isso também gera uma pressão inflacionária aqui no Brasil, porque somos muito dependentes de insumos de produção importados.”
O cenário de instabilidade no Oriente Médio, portanto, promete reverberar diretamente na economia brasileira, exigindo atenção e planejamento por parte do governo e dos consumidores.